Para Inspirar

Regis Adriano em "A importância do amor próprio"

Conheça a história de como o foco venceu as drogas, na décima quarta temporada do Podcast Plenae.

10 de Dezembro de 2023



Leia a transcrição completa do episódio abaixo:

[trilha sonora] 


Regis Adriano: Eu morei cinco anos na Cracolândia. O morador de rua sofre muitas violências gratuitas. A gente, como ser humano, olha o mundo com base no nosso umbigo e acha que a pessoa tá na rua porque quer. Esse é um olhar simplista. A gente não sabe nada sobre o outro, mas sabe julgar. Eu conheci gente que começou a usar crack porque foi abusada sexualmente, porque perdeu a casa e até porque ouviu dizer que era bom pra emagrecer.  


[trilha sonora] 


Geyze Diniz: Regis Adriano foi usuário de drogas por quase metade dos seus 49 anos. No auge da dependência química, fugiu de casa pra morar na Cracolândia, no centro de São Paulo. Ele se internou sete vezes pra se livrar do crack. Mas, a ferramenta que funcionou mesmo pro Regis abandonar as drogas foi o resgate do amor próprio, com a ajuda de uma antiga paixão: o skate. Eu sou Geyze Diniz e esse é o Podcast Plenae. Ouça e reconecte-se. 


[trilha sonora] 


Regis Adriano: Eu comecei a furtar com uns 8 anos de idade. Os primeiros furtos eram uns brinquedinhos que eu pegava na casa dos meus primos. Depois, eu passei a pegar dinheiro das crianças na escola. Quando a minha mãe descobria, ela me batia. Era assim que os pais educavam os filhos naquele tempo. Só que, quanto mais eu sofria agressões, mais danado eu ficava.  


Não tinha nenhum criminoso na família. Eu que sou rebelde por natureza. Quando eu fiz 14 anos, o meu pai, que era metalúrgico, me colocou pra estudar no SENAI. Ele me arrumou também um emprego onde ele trabalhava. Era um programa parecido com o Jovem Aprendiz de hoje. Aí, eu comecei furtar dentro dessa empresa.  


Um dia, eu cheguei pra trabalhar e vi uma viatura da polícia parada na frente da firma. Achei que tivessem descoberto os meus furtos, e eu mesmo me entreguei. Só que os policiais estavam lá por outro motivo. Ninguém sabia dos meus crimes. O meu contrato, lógico, foi encerrado. Em consideração ao meu pai, que trabalhou 36 anos nessa empresa, eu não fui demitido por justa causa.  


[trilha sonora] 


Foi mais ou menos nessa época que eu comecei a andar de skate. Não falei que eu era rebelde? Nos anos 80, o skate era pura rebeldia. Hoje é esporte olímpico, mas naquele tempo era uma parada marginalizada, sem regra. O skate era tão mal visto, que chegou até a ser proibido em São Paulo.  


Quando eu vi aqueles caras com cabelo diferente e roupa colorida, eu quis ser um deles. A galera do skate pichava e eu comecei a pichar também. A minha mãe, claro, não gostou. Não gostou nada disso, nem das minhas novas amizades. Mas, se a minha mãe não gostava, aí é que eu gostava mais ainda.  


[trilha sonora] 


Um dia, a minha mãe desconfiou que eu estava usando droga. Ela falou brava: “Seu olho tá vermelho! Vem aqui, deixa eu cheirar a sua mão!”. Mas, eu nunca tinha usado nada. Só porque ela me desafiou, aí que eu quis usar mesmo. Quando eu encontrei um amigo do skate fumando um baseado, eu pedi um trago.  


[trilha sonora] 


O que eu não sabia é que eu tenho a predisposição genética pra ser adicto.  


[trilha sonora] 


Várias pessoas na minha família são alcoólatras. Eu gostei de maconha. Um ano depois, comecei usar a cocaína. Dois anos depois, já estava no crack. No terceiro ano, me envolvi com o tráfico.  


[trilha sonora] 


Eu achava que a vida dos traficantes era mais glamourosa que a minha. Eu pegava trem e entrava no trabalho às 7 da manhã. Enquanto isso, os traficantes andavam de carro e sempre tinham umas minas do lado. A minha mente de otário pensou assim: “Ah, eu já gosto de usar droga e lá tem um monte. E ainda vou ganhar dinheiro e andar com as minas”. No primeiro ano de tráfico, eu fui preso e condenado a 4 anos e seis meses de prisão. Eu fiquei 2 anos, 9 meses e 22 dias na cadeia. 


O período na prisão foi tenebroso, porque, além de tudo, eu era usuário de crack. Na rua, eu fazia os meus corres e conseguia comprar droga. Na cadeia, era a minha família que tinha que pagar. O dependente químico põe a droga acima do risco de vida. Eu manipulava o medo da minha mãe e ela acabava pagando as dívidas que eu contraía dentro da prisão.  


Eu sempre fui bagunceiro mas, depois da droga, a minha vida se desgovernou totalmente. Depois que eu saí da cadeia, a minha mãe tentou evitar que eu voltasse pro tráfico. Ela pediu pro dono de uma empresa de usinagem do meu bairro, em Caieiras, na Grande São Paulo, pra me dar um emprego. Ele me deu uma oportunidade e eu comecei a reconstruir a vida.  


[trilha sonora] 


Esse empresário decidiu terceirizar a firma e propôs que os funcionários comprassem as máquinas, num esquema de cooperativa. Eu topei. O problema é: eu ainda usava droga. Eu trabalhava de dia e usava crack à noite. A droga tomou conta da minha vida e eu perdi a empresa. Ah, eu perdi o skate também. Quando eu não tinha mais dinheiro, eu trocava um skate que valia mil reais por uma pedra de 5.  


Mas, o pior foi perder a minha família. Nessa época, eu era casado e tinha três filhos. O ano em que eu fumei o primeiro baseado foi o ano que a minha primeira filha nasceu. Eu fui um pai totalmente ausente. Eu cheguei a trocar a bicicleta do meu sobrinho por droga. As crianças dormiam no escuro, porque eu gastei o dinheiro da luz em crack. A família do dependente sofre demais. Meus filhos hoje nem falam comigo. 


[trilha sonora] 


Eu decidi me internar pela primeira vez por vergonha dos meus erros. Quando eu saí da clínica, tive uma recaída. Me internei de novo e recaí de novo. Foram sete internações em oito anos. Em uma delas, eu fiquei dois anos morando na clínica. Não adiantou. Até que eu perdi a confiança em mim e desisti. E decidi morar na rua, comendo resto de comida que eu achava no lixo. Foram cinco anos vivendo na Cracolândia.  


[trilha sonora] 


Eu me virava com furtos, como de torneiras das casas, e trocando lixo reciclável por dinheiro. Um dia, passou por mim um cara fortão tentando me hostilizar. Era um careca, desses adeptos do movimento “white power”. Eu tive a ingenuidade de falar “bom dia”. Esse cara começou a me bater. Já fazia alguns dias que eu não comia. Eu não tive nem força pra correr. Fiquei ali apanhando. 


[trilha sonora] 


No centro de São Paulo, muita gente anda de skate. Teve um dia que eu tava pegando papelão e vi umas mil pessoas descendo a Rua da Consolação. Era um encontro em comemoração ao Dia Mundial do Skate. Eu chorei demais. Eu pensava: “Meu Deus do céu. O que que eu tô fazendo na minha vida?”.  


[trilha sonora] 


De vez em quando, eu pedia pra dar uma voltinha numa pista. Aí os moleques falavam: “Tiozão, você não anda de skate nada”. Aí, eu respondia: “Deixa eu andar pra você ver”. Aí eu dava um rolê e eles ficavam impressionados. Um deles me falou: “Ê tiozão, volta para casa, mano, você faz mó falta pro skate”. O outro me disse: “E parça, você tem uma energia daora”.  


E frases assim me faziam chorar. O skate me lembrava da minha humanidade. Quando eu estava na rua, eu não me sentia mais um ser humano. Eu me sentia um bicho. Eu carregava muita culpa, muito trauma. Eu não conseguia ver o que eu tinha de bom. Só enxergava as partes ruins.  


[trilha sonora] 


A minha vida começou a mudar quando um prefeito de São Paulo implementou uma política pública para redução de danos. Era o programa “De braços abertos” do CAPS, Centros de Atenção Psicossocial, que acolhia moradores de rua e oferecia terapias. No SUS, eu fui recebido por um psicólogo muito amoroso e dedicado. Com a ajuda dele que eu comecei a sair do buraco. Comecei a ressignificar a minha vida. 


O primeiro passo foi enxergar a minha responsabilidade por aquela situação de vida. Várias vezes eu falava: “Ah, o cara que me ofereceu a droga”. Eu punha a culpa no outro, não em mim. Aí o psicólogo me falou: “O que acontecer aqui é culpa sua”. Eu entendi que as drogas sempre vão existir no mundo. Depende de mim estender o braço pra pegar ou não.  


Na terapia, eu passei a refletir sobre a minha relação com o crack. As pessoas usam drogas pra escapar de alguma dor. Comigo não foi diferente. Eu me lembrei que, na minha infância, eu me sentia rejeitado. Eu não tive contato com o meu pai biológico. Eu achava que o meu padrasto, que me criou e foi um bom pai pra mim, me rejeitava. Achava que a minha mãe gostava mais do meu irmão mais velho. Eu me sentia o patinho feio da família. 


Eu era um cara cheio de complexos. O psicólogo me ajudou a resgatar o meu amor próprio. Ele dizia que eu não tinha que me importar com a opinião do outro sobre mim. O importante é como cada um se vê. Eu falava: “Eu sou feio, as pessoas não gostam de mim”. Ele dizia: “Essa não é uma situação permanente. Aprende a se cuidar, Regis. Eu sei que é difícil, mas se você aprender a se cuidar, sua vida vai ser uma outra. Olha pro seu passado e encontra onde você se perdeu”.  Por causa de um ato de rebeldia contra a minha mãe, eu me perdi. Mas, isso não quer dizer que eu estou perdido para sempre.  


Na terapia, eu entendi que eu sou um cara bom e comecei a me apropriar disso. Um dia, a polícia foi dispersar o fluxo na Cracolândia. Já tinha tido várias incursões da polícia lá, só que eu nunca tinha visto com os meus próprios olhos. Eu vi um monte de gente machucada, mas comigo não aconteceu nada. Eu lembrei do Salmo 91, da Bíblia, que diz: “Mil poderão cair ao seu lado; dez mil, à sua direita, mas nada o atingirá”. Deus estava me dando mais uma chance, das muitas que ele me deu e eu não aceitei. Aquele dia, pra mim, foi a gota d’água e voltei pra casa. 


[trilha sonora] 


Eu continuei com a terapia e o psicólogo disse que eu precisava de alguma fonte de prazer pra substituir a droga. Não na mesma intensidade, mas algo que me deixasse alegre. Muitas pessoas param de usar drogas e não buscam preencher o dia a dia com nada. Aí, a vida parece vazia. O psicólogo me explicou sobre a importância da atividade física. O nosso cérebro libera serotonina e dopamina. São neurotransmissores responsáveis pelo bem-estar e pelo prazer. Era a justificativa que eu precisava pra voltar ao skate. 


[trilha sonora] 


Já fazia uns quatro meses que eu não usava crack, quando chegou o Dia Mundial do Skate, 21 de junho, a minha mãe, que já estava começando a acreditar em mim, viu o esporte com outros olhos. Ela me deu o dinheiro para eu levar meus sobrinhos, que são crianças, no encontro. Foi um dia muito emocionante pra mim. Quantas vezes eu saí de casa de skate e voltei a pé… Dessa vez, eu voltei de trem, com o skate debaixo do braço e na companhia dos meus sobrinhos. 


[trilha sonora] 


Quando eu era novo, eu andava de skate pensando nas manobras. Agora, ele é muito mais do que uma tábua de madeira com quatro rodinhas. Ele virou a minha ferramenta de resgate. Uma, duas ou três vezes por semana, eu pego meu skate e, só de sair por aí remando, o meu estresse e a minha ansiedade já vão diminuindo. Consequentemente, a minha fissura também.  


Depois que eu parei de usar droga, eu voltei a estudar, me formei no Ensino Médio e quero prestar vestibular pra jornalismo. Eu escrevi um livro sobre a minha história, ele se chama "Skate no caminho das pedras". Pretendo publicar outro, de poemas. A escrita virou a minha terapia. Eu publico os meus textos em uma página do Facebook que se chama “Usuários”. A minha história ajuda dependentes químicos e familiares de pessoas que passam por esse problema. A minha dopamina hoje é ajudar os outros. 


[trilha sonora] 


Eu tenho 49 anos. Fui usuário de drogas por 25 anos. Faz 4 anos e 8 meses que eu tô limpo. Eu não preciso mais da droga pra ter o prazer. Eu tenho o skate, que é uma fonte de prazer saudável. O esporte me ajudou a resgatar a autoestima, a sensação de superação e o senso de coletividade. De certa forma, é uma ferramenta de resgate, porque o crack tirou o skate de mim.  


Quando eu sinto o vento no rosto, eu me conecto com aquele Regis, o adolescente que nunca usou droga. Eu me lembro que a minha vida pode ser outra. Eu não me abandono mais. Sou obstinado pela minha recuperação. E é isso que eu tento inspirar em outras pessoas: que elas sejam obstinadas pelas próprias vidas e pelos próprios sonhos.  


[trilha sonora] 


Geyze Diniz: Nossas histórias não acabam por aqui. Confira mais dos nossos conteúdos em plenae.com e em nosso perfil no Instagram @portalplenae.


[trilha sonora] 

Compartilhar:


Para Inspirar

Como nasce o amor materno?

Conhecido como o “amor mais forte do mundo”, a ciência explica como não é preciso gerar para que esse sentimento seja aflorado

7 de Julho de 2023


Chegamos ao final da décima segunda temporada e ela não poderia fechar de forma mais emocionante: com o relato de maternidade de Fabiana Fabris. Ela, que adotou 5 filhos - sendo 4 irmãos -, narra em seu episódio um pouco de como foram as suas tentativas de gestar e como ela entendeu que, para ser mãe, havia algo muito maior e mais profundo do que conseguir engravidar.

Foi quando Fabris retomou um sonho antigo, que era o de adotar crianças com idade até mais avançada. O que ela não sabia é que essa jornada seria repleta de aprendizados, sendo que o principal deles foi a chave do sucesso: entender que o amor materno é, na realidade, uma construção. E é sobre isso que falaremos hoje!

A ciência das mães

Toda mãe é um pouco cientista, como já disse o ditado. Mas, em abril, às vésperas do Dia das Mães, fomos entender um pouco mais sobre essa relação entre ciência e maternidade. Chegamos a algumas curiosidades sobre o tema. São elas:

  • O simples toque de uma mãe, onde há um investimento de libido - essa energia que habita em todos nós - é capaz de acelerar processos de cura, diminuir dores, entre outros benefícios comprovados para a saúde.

  • A saliva materna também é capaz de curar e, até mesmo uma chupeta limpada pela boca de uma mãe já oferece esse benefício

  • A mãe é a porta de entrada para a linguagem, se tratando de bebês muito pequenos. 

  • A figura materna é tão onipresente que há indícios de que os homens da caverna já possuíam sua própria forma de chamar pelas suas. 

  • Mães que continuam trabalhando apresentam menos chance de ter depressão, mais energia e mais mobilidade.

  • Para as mães que gestam, o processo da gravidez envolve, dentre outras coisas, transmitir nutrientes e células pela placenta. 

Além dessas curiosidades, sabemos também que há um processo hormonal complexo e muito benéfico que está intimamente ligado à maternidade. Estamos falando da liberação da ocitocina que, como te contamos aqui, é um dos hormônios ligados ao bem-estar.

Produzido pela glândula da hipófise, também localizada no cérebro, sua principal função é promover a saída de leite das glândulas mamárias, ou seja, muito importante para as mães que estão amamentando. Porém, no cérebro ela também tem apresenta funções que estão relacionadas ao cuidado, a sensação de amor fraternal, materno, paterno. 

Estudos comprovam, aliás, que animais com mais ocitocina tendem a ter mais cuidado com filhotes e são mais sociáveis. Um “atalho” para liberar mais ocitocina é, por exemplo, segurar um bebê, ter um animal de estimação ou até mesmo ter uma planta - esse em menor grau. Tudo que estimule a sensação de cuidado trará junto a sensação de felicidade, aquela que sentimos quando estamos perto de um filhote. 

A construção do amor

Esses foram alguns dos muitos exemplos possíveis do que a ciência já estudou em relação ao amor materno, que é uma das manifestações mais antigas, potentes e analisadas do mundo. Mas, é importante lembrar que o amor materno é uma construção. Não é imediato e nem inerente a nenhum processo automático. 

Todos os dias, mães se sentem confusas e pressionadas a sentirem esse mergulho intenso e prometido quando, na verdade, ainda não o sentem. E essa culpa materna, como te contamos aqui, vai se acumulando e se tornando nociva para as duas partes desse relacionamento: mãe e filhos.

Esse assunto é tão importante que dedicamos um Tema da Vez inteiro só para pensarmos na maternidade de forma mais ampla e livre de tabus ou preconceitos. A começar pelo famigerado instinto materno, refutado por diversos estudos que vão da psicanálise à antropologia, da sociobiologia à etologia. 

Esse desejo pela maternidade, que muitas vezes é legítimo, outras vezes é influenciado em grande medida pela nossa cultura, estruturas políticas e econômicas. As mulheres têm filhos por várias razões, incluindo o desejo de satisfazer pais, maridos e amigos, pelo medo da solidão e até mesmo como investimento na velhice, o que está longe de ser um impulso de procriar. 

Atrelar a maternidade a um suposto instinto biológico contribui para a construção da imagem da mãe que dá conta de tudo, pois seria “natural para ela”. Essa idealização gera uma enorme pressão, e é por isso que mulheres buscam quebrar o silêncio na busca de “desmascarar a maternidade”. É o caso de Katherine Wintsch em seu Ted Talk, onde ela revela que em um estudo com mais de 5 mil mães de mais de 17 países, todas, sem exceção, sofrem por não atingirem esse ideal.

Adotando e aprendendo

Agora que desmistificamos essa ideia de que o instinto materno é real e que uma mãe nunca cansa e sempre ama o seu filho é lenda, podemos pensar também nas mães adotivas, que têm frequentemente o seu amor pelos filhos colocados em xeque por não terem gerado suas crias. Parece absurdo, afinal, adotar exige ainda mais intencionalidade do que engravidar, portanto, parte-se do princípio que essa mãe que adotou quis muito ser mãe. 

Podemos começar por ela novamente: a ciência. Um estudo comprovou que o estímulo do cuidado de uma mãe adotiva libera a ocitocina que explicamos anteriormente tanto quanto a maternidade biológica. Essa ocitocina vai educando e explicando para o cérebro dessa mãe que ela agora é responsável por aquela vida, portanto, o senso de obrigação é o mesmo. 

Essa modificação cerebral e esse hormônio se dão por meio de sorrisos, afetos positivos, elogios, palavras positivas e encorajamento ativo. Os testes demonstraram que, nos primeiros meses da adoção, a empatia dessa mãe está relacionada à uma imagem de crianças em geral. 

Mas, com o decorrer do tempo, a produção de ocitocina é maior quando essa mesma mãe é exposta a imagens específicas do seu filho, o que demonstra como esse vínculo foi fortalecido ainda mais. O cérebro dessa mulher passa a se comportar de maneira bem próxima ao de uma mãe que gerou.

Para que a ciência seja colocada em prática, é preciso, claro, convivência. Por isso mesmo, a lei brasileira garante que pais que adotaram têm direito à licença parental, justamente porque entende-se que o trabalho é o mesmo ou até maior, pois exige essa conexão com o universo prévio dessa criança, que precisa se sentir segura e parte dessa família. Incluí-la em atividades, como demonstra essa pesquisa, é um caminho eficaz para isso, tipo jantares ou encontro com outros familiares. 

Para Fernanda Fabris, personagem do nosso Podcast, o caminho encontrado foi entender primeiramente que essas crianças não precisam ser salvas e que você não está fazendo nenhum favor ao adotá-las, mas sim, que elas precisam ser amadas. 

Em segundo lugar, entender que essa adaptação não tem que vir só da parte dessa criança, que ela precisa ser “fácil” para as coisas darem certo. Até mesmo porque, muitas vezes, essa criança foi machucada e naturalmente possui menos mecanismos para lidar com seus sentimentos do que um adulto. Quem faz dar certo, como diz Fernanda, é a mãe e o pai, não o filho.

Em seus estudos, Fernanda se aprofundou no comportamento de cada idade, nos estudos de neurologia e na psicologia. “Eu aprendi que a criança que sofreu acolhimento tem a região da amígdala cerebral mais estimulada. A amígdala é a estrutura ligada às emoções. Por outro lado, o córtex cerebral delas, que é o sistema que representa a razão, é menor. Toda vez que essas crianças se veem numa situação de perigo, elas reagem. E não adianta bater de frente. Não adianta gritar, que é justamente o que nós, pais, fazemos. A ciência mostra que, quando a gente vai construindo o vínculo afetivo, a pessoa passa por um processo de neuroplasticidade. Ela começa a pensar e agir de forma consciente”, conta ela. 

Com a psicologia, ela entendeu que a rejeição era um mecanismo de defesa inconsciente das crianças, que pensam “Se eu gostar dela e ela me levar de volta para o abrigo, eu vou sofrer. Então, eu rejeito ela, assim ela não gosta de mim, eu também não gosto dela e eu não sofro”. 

Foi preciso ainda que ela mergulhasse dentro de si, em um processo de autoconhecimento profundo, para entender que alguns de seus desconfortos diziam respeito a padrões dela mesmo, e de mais ninguém. De dores da sua própria infância, projetadas ali, na infância de seus filhos. 

Por fim, Fernanda aprendeu ainda a respeitar e valorizar o passado prévio dessa criança, a importância da sua família biológica e ensiná-los a continuar escrevendo a sua história a partir dali. “A adoção não vem com uma borracha mágica. A gente tem que ter muito respeito por essa família, para que os nossos filhos se aceitem e se livrem da culpa que eles carregam. Quando a gente respeita os pais biológicos, a gente ensina as crianças que elas têm que se respeitar, que elas são dignas de amor e de afeto”, conta.

“Todos os dias eu vejo famílias que entram no processo adotivo com a intenção de fazer uma caridade. O problema é que, com essa mentalidade, esses adultos vão esperar um senso de gratidão em troca. E a criança e o adolescente não tem nem maturidade cerebral para ser grato. É um erro pensar que as crianças precisam ser salvas. Elas só precisam ter pais e mães. Elas precisam de amor”, conclui. 

Histórias de amor familiares são escritas à várias mãos. Liberte-se da ideia de que elas se dão de maneira automática e comece a construir a sua própria, da maneira como ela funciona para você. 

Compartilhar:


Inscreva-se na nossa Newsletter!

Inscreva-se na nossa Newsletter!


Seu encontro marcado todo mês com muito bem-estar e qualidade de vida!

Grau Plenae

Para empresas
Utilizamos cookies com base em nossos interesses legítimos, para melhorar o desempenho do site, analisar como você interage com ele, personalizar o conteúdo que você recebe e medir a eficácia de nossos anúncios. Caso queira saber mais sobre os cookies que utilizamos, por favor acesse nossa Política de Privacidade.
Quero Saber Mais